'Fiquei com sequelas neurológicas, e não é nada leve', afirma sobrevivente de intoxicação por arsênio em bolo, um ano depois

Escrito em 23/12/2025


IGP detalha análises que identificaram arsênio no bolo A sobrevivente de duas intoxicações por arsênio Zeli Teresinha dos Anjos, 63 anos, contou como vive com sequelas há um ano em entrevista à jornalista Pâmela Rubin Matge, de GZH. Outras três mulheres não resistiram e morreram intoxicadas. Todas comeram um bolo com arsênio em Torres, no Litoral do RS, dias antes do Natal de 2024. A sobrevivente conta que, após 14 dias em uma UTI, de um total de 18 dias internada, as sequelas neurológicas são sentidas através de dormência, formigamento e fraqueza, consequências da neuropatia periférica. "Fiquei com sequelas neurológicas, que afetam as mãos e as pernas, e não é nada leve. Agora não tem mais o que fazer", diz. 🔎 ☣️ O que é arsênio: De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o arsênio é uma das 10 substâncias de maior preocupação para a saúde pública. Ele é um subproduto tóxico obtido a partir do tratamento de minérios de cobre, cobalto, chumbo, níquel, ouro e zinco. Um composto inorgânico do elemento muito conhecido é o arsênico, ou trióxido de arsênio, que é usado como veneno em pesticidas. A exposição a arsênio pode causar intoxicação alimentar e reações similares a alergias, câncer em caso de exposição recorrente, e até morte. 📲 Acesse o canal do g1 RS no WhatsApp As vítimas são as irmãs de Zeli, Maida Berenice Flores da Silva e Neuza Denize Silva dos Anjos, além de Tatiana Denize Silva dos Anjos, filha de Neuza. Zeli, que recebeu alta do hospital em janeiro, e uma criança de 10 anos foram as únicas sobreviventes. ➡️ O que diz a Anvisa? O uso do composto como inseticida e raticida, substâncias para eliminar insetos ou roedores, é proibido no Brasil. De acordo com a resolução 42 de 29 de agosto de 2013 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o arsênio pode estar presente em alimentos industrializados, mas em quantidades mínimas, que obedecem a limites estabelecidos. Zeli seria o principal alvo de Deise Moura dos Anjos, sua nora, que foi apontada pela polícia como a autora dos quatro homicídios, triplamente qualificados por motivo fútil, emprego de veneno e dissimulação. Presa temporariamente em janeiro, ela foi encontrada morta na Penitenciária Estadual Feminina de Guaíba. (Relembre o caso abaixo) Zeli afirma que vive com medo de ser reconhecida ao citar seu nome, por conta da exposição do caso. "Digo meu nome completo baixinho para ninguém ouvir, mas as pessoas reconhecem quando ouvem", conta. "Queríamos ser esquecidos", relata. Atualmente, Zeli mora com o neto e um filho, em outra cidade. "Mudei para ficar com eles, que é tudo que sobrou 'do meu sangue'", completa. Mulher que sobreviveu a bolo envenenado com arsênio, Zeli dos Anjos dá entrevista ao Fantástico TV Globo/Reprodução O uso de arsênio Agora, em dezembro de 2025, um ano após as mortes, a polícia concluiu a investigação sobre a origem do arsênio utilizado nos crimes. A apuração revelou que a compra foi feita por meio de dois sites distintos, mas ambos pertencentes à mesma empresa, registrada no Rio de Janeiro. A Delegacia do Consumidor (Decon) identificou o responsável pela venda, mas reforçou que, apesar do risco à saúde, não há previsão penal para esse tipo de negociação. Segundo a polícia, a comercialização do produto não é considerada ilegal atualmente, já que não existe regulamentação específica que proíba a venda para pessoas físicas. "Tal venda não é proibida e ainda está pendente de regulamentações", explica a delegada Milena Simioli. Bolo envenenado com arsênio está recolhido no IGP Divulgação/IGP Contudo, a polícia reconhece que podem existir infrações de caráter administrativo, mas ressalta que a fiscalização dessas substâncias é responsabilidade da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que avalia se houve descumprimento das normas sanitárias e de segurança na comercialização do produto. O g1 entrou em contato com a Anvisa, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem. A delegada Milena ainda comenta que dois projetos tramitam na Câmara dos Deputados para tentar corrigir essa brecha, sendo: PL 985/2025 e PL 1381/2025. As propostas pretendem proibir a venda de compostos arsenicais a pessoas físicas e exigir justificativa técnica para uso, além de reforçar mecanismos de identificação do comprador. 🔎 O PL 1381/2025 está parado na Comissão de Indústria, Comércio e Serviços, aguardando novo relator após devolução sem parecer. Já o PL 985/2025 segue na Comissão de Saúde, com parecer favorável e substitutivo apresentado, mas ainda não votado, após apensação do PL 2771/2025. Relembre o caso Episódio 1: O Caso do Bolo Envenenado De acordo com a Polícia Civil, sete pessoas da mesma família estavam reunidas em uma casa, durante um café da tarde, quando começaram a passar mal após comer fatias do bolo. Zeli dos Anjos, que preparou o doce em Arroio do Sal e levou para Torres, também foi hospitalizada. Ela era irmã de Maida e Neuza, sogra de Deise e alvo do envenenamento, segundo a Polícia Civil. Entenda quem é quem no caso do bolo em Torres Assista documentário sobre o caso que chocou o Brasil Leia entrevista com Zeli dos Anjos Investigação Polícia do RS conclui investigação sobre caso do bolo envenenado A investigação concluída em fevereiro confirmou que três familiares morreram em dezembro de 2024, após comerem o bolo envenenado com arsênio, e três meses antes, o sogro de Deise morreu ao ingerir bananas e leite em pó contaminados levados pela nora. Presa temporariamente desde 5 de janeiro, Deise foi encontrada morta na cela na Penitenciária Estadual Feminina de Guaíba. Não há indiciamento, pois o Código Penal prevê a extinção da punibilidade. A polícia descartou motivação financeira para os crimes que teriam sido cometidos por Deise. A principal hipótese é "perturbação mental". De acordo com o Ministério Público do RS, em casos como o de Deise Moura dos Anjos, que morreu enquanto era investigada, "o processo é extinto pela morte do agente quando a punibilidade do réu é extinta, o que acontece de acordo com o artigo 107, inciso I, do Código Penal". VÍDEOS: Tudo sobre o RS
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